TESTAMENTO
DO PADRE CÍCERO
Prezados, após análise, resolvemos publicar o Selo de Abertura do Testamento e o Testamento com seu conteúdo na íntegra. Mantendo-se a grafia usual na época.
Transcrito por Sálvio Siqueira
Padre Cícero - historiaesuascuriosidades.blogspot.com.br
O SELO
"Joaseiro,
27 de julho de 1934.
(Selado
com 2(duas) estampilhas de 2000 reis; 1 (uma) de 300 reis e outra sem valor
expresso).
Termo de
abertura do testamento cerrado com que faleceu nesta cidade o Padre Cíceo Romão
Batista. Aos vinte e sete dias do mês de Julho do ano de mil novecentos e
trinta e quatro, ás dés horas, nesta cidade do Joaseiro, Estado do Ceará, em
casa de residencia do falecido testador, aí presente o Juiz Municipal Doutor
Plácido Aderaldo Castelo, comigo segundo Escrivão do seu cargo abaixo assinado
por Dona Joana Tertulina de Jesus, foi apresentado ao referido Juiz, presentes
varias pessôas gradas e autoridades locaes destacando-se o Reverendissmo
Monsenhor Vicente Sátér de Alencar Vigario Geral da Diocese, Monsenhor Pedro
Esmeraldo, Padre Juvenal Coalres Maia, Doutores Júvencio Joaquim de Santana,
Manuel Belem de Figueiredo e Mozart Cardoso de Alencar e os cidadãos Antonio
Luis Alves Pequeno, Jesús Rodrigues, Coletôr Estadual, Francisco Botelho Filho,
José Ferreira de Meneses, José Fausto Guimarães, José Herminio Amorim, Fausto
da Costa Guimarães, Francisco Neri da Costa Marato, Pedro Silvino de Alencar,
João Alves da Silva Bucuráo, Francisco Edgard Lima Braga, Vicente Pereira da
Silva, Primeiro Escrivão, João Bernardo da Costa, varias senhoras, foi
verificado exteriormente o aludido documento que não acusava nenhum inicio de
violação, devidamente lacrado, com a inscrição seguinte: “Testamento cerrado do
Padre Cícero Romão Batista “ approvado na forma da Lei, aos quatro de outubro
de mil novecentos (trinta e tres, digo novecentos vinte e tres, por mim segundo
Tabellião desta Comarca de Joaseiro Luiz Theophilo Machado. Aberto o testamento
pelo proprio Doutor Juiz Municipal foi o mesmo lido em vóz alta e ouvido por
todos os presentes no dia hora acima descritos; que o mesmo testamento foi
apresentado por Dona Joana Tertulina de Jesús, em poder de quem se achava o
dito documento por lhe ter sido confiado pelo testador Reverendissimo Padre
Cicero Romão Batista; que sempre como acaba de demonstrar guardou
cuidadosamente referido documento, pessôa que áxa como é publico e notoria de
absoluta confiança do testador; que desde quinze anos de idade a apresentante
residio com o testador, contando hoje a idade – sessenta e nove anos de idade;
que assim eram real e verdadeira a amizade e confiança do testador para com a
apresentante; que o testador faleceu nesta cidade aos vinte dias do mes de
Julho do ano de mil novecentos trinta e quatro e chamava-se Padre Cicero Romão
batista, filho legitimo dos falecidos Joaquim Romão Batista e Dona Joaquina
Vicencia Romana, solteiro, brasileiro, domiciliado e residente nesta cidade,
Clerigo; nenhum vicio como já foi dito foi encontrado externamente achando-se
portanto intáto. Do que para constar lavrei este termo de abertura que depois
de lido será assinado pelo Juiz, apresentante, testemunhas e por Antonio
Machado, segundo Escrivão interino.
Plácido
Aderaldo Castelo
Joana
Tertulina de Jesus
Mons.
Vicente Sother de Alencar
Mons.
Pedro Esmeraldo
Padre Juvenal
Colares Maia
Antonio
Luis Alves Pequeno
Manuel
Belem Figueiredo
Dr Mozart
de Alencar
Juvencio
Joaquim de Santtana
José
Ferreira de Meneses
Pedro
Silvino de Alencar
João
Alves da Silva Bacurau
José
Fausto Guimarães
Jesus
Rodrigues
José
Herminio Amorim
Francisco
Edgar Lima Braga
Francisco
Neri da Costa Morato
Francisco
Botelho Filho
Fausto da
Costa Guimarães
José
Armando Bezerra de Meneses
Vicente
Pereira da Silva
Mons.
Tenorio de Assis
Antônia
[ilegível] Silva
Maria
Ramos Costa
Julia
Violeta Botelho
Lindalva
Fernandes d'Oliveira
José
Geraldo Cruz"
O TESTAMENTO
"1934
Juizo Municipal de Joazeiro, do Estado do Ceará O Escrivão do 2º Ofício,:interino:
Machado
Execução do Testamento do Padre Cícero Romão Batista.
Testamenteiro:
- Cel. Antônio Luiz Alves Pequeno
Autoação
Aos vinte e sete dias do mês de Julho do
ano de mil novecentos trinta e quatro (1934), nesta cidade do Joazeiro,
na comarca do Crato, do Estado do Ceará, em meu cartório, autoei o
Testamento com o termo respectivo de abertura que adiante se vê; do que
fiz este termo. O 2º Escrivão Intº.
Antônio Machado
Em nome de Deus Amen.
Eu, Padre Cícero Romão Baptista,
achando-me adoentado, mas sem gravidade, e em meu perfeito juízo, e na
incerteza do dia da minha morte, tomei a resolução de fazer o meu
testamento e as minhas ultimas disposições, para o fim de dispôr dos
meus bens, segundo me permitem as leis do meu paiz.
E como, devido ao meu actual incommodo,
não posso levar muito tempo apurado em escrever este longo documento,
nem quero fazer um testamento publico, mas sim um testamento cerrado, de
accordo com o artigo mil seicentos e trinta e oito e seus paragraphos
do Codigo Civil Brasileiro, pedi ao meu amigo Luiz Theophilo Machado,
segundo Tabellião de Notas desta comarca, que por mim escrevesse este
meu testamento em minha presença, e por mim ditado, reservando-me para
assignal-o com o meu proprio punho.
Declaro que sou filho legítimo dos
fallecidos Joaquim Romão Baptista e Dona Joaquina Vicencia Romana e
nasci na cidade do Crato, neste Estado do Ceará, no dia vinte e quatro
de março de mil oitocentos e quarenta e quatro (1844).
Como profissão, adoptei o Ministério
Sacerdotal, de accordo com as Ordens que me fôram conferidas pelo então
Bispo do Ceará Dão Luiz Antonio dos Santos, de saudosa memoria,
exercendo-o, conforme a minha vocação, com amor, dedicação e bôa
vontade, e desejando assim continuar em quanto o Bom Deus, pela sua
Divina Misericórdia me conceder força e consciencia dos meus actos.
Declaro mais que desde minha Ordenação,
mesmo durante o pouco tempo que fui Vigario da Parochia de São Pedro do
Crato, nunca percebi um real sequer pelos actos religiosos que tenho
praticado como Sacerdote Catholico.
Declaro ainda que todos os dinheiros que
me fôram e continuam a ser dados, como offertas a mim unicamente, os
tenho distribuído em actos de Caridade que estão no conhecimento de
todos, bem como em grandes e vantajosas obras de agricultura, cujo
resultado tenho apliccado em Bens, que ora deixo, na mór parte para a
Benemerita e Santa Congregação dos Salesianos, afim de que ella funde
aqui, no Joazeiro, os seusCollegios de educação para crianças de ambos
os sexos.
Desde muito cêdo, quando comecei a ser
auxiliado com esmolas, pelos romeiros de Nossa Senhora das Dores que
aqui chegavam, a par do auxilio efficaz por mim feito para o
desenvovimento desta terra, resolvi applicar parte das mesmas esmolas
recebidas em propriedades, visando assim fazer um patrimônio para ajudar
uma Instituição Pia e de Caridade que podesse aqui continuar a sua Obra
Bemfazeja.
E por que, dentre todas as existentes,
nenhuma se me afigura mais benemerita e de acção mais efficaz e de
Caridade mais accentuada do que a dos bons e santos discipulos de D.
Bosco, os Benemeritos Salesianos, a elles deixarei quase tudo que
possúo, conforme adiante declaro.
E rogo a esses bons e verdadeiros servos
de Deus, os Padres Salesianos que me façam esta grande Caridade,
instituindo nesta terra uma obra completa.
Estou certo, não só por que conheço a
indole deste povo aqui domiciliado, assim como das populações sertanejas
que aqui frequentam e que por meio de bons conselhos tenho educado na
pratica do Bem e do Amor a Deus e mais ainda por que o pedido que faço,
estou certo, repito, que todos os romeiros aqui domiciliados ou de
pontos distantes, como prova de estima e amizade a mim e em louvor e
honra a Virgem Mãe de Deus, continuação a frequentar este meu amado
Joazeiro, com a mesma assiduidade, e audiliarão aos Benemeritos Padres
Salesianos, como se fôsse a mim proprio, para manutenção aqui da sua
Obra de Caridade Christã, isto é, dos seus collegios, cuja existência
desses mesmos Collegios nesta terra para todo e sempre, será a maior
tranquilidade para minha alma na outra vida.
Declaro, outrosim, que os dinheiros que
tenho recebido para mandar celebrar Missas, conforme a intenção das
pessôas que m'os tem dado, os tenho distribuido com o maior criterio,
por intermedio dos Padres e Vigarios desta e de outras Dioceses e de
algumas Instituições Religiosas do paiz e do extrangeiro.
Devo accrescentar que os dinheiros que
me tem sido entregues para applicar como entendesse e quizesse, na
intenção, louvor e honra de Nossa Senhora das Dores, sem nenhuma outra
condição, do mesmo modo os tenho applicado com muita consciencia em
actos de caridade, em auxilio a Obras e Instituições Pias e em bens que
ora deixo conforme vae adiante declarado para Nossa Senhora das Dores,
Padroeira desta Matriz e para Santa Congreção dos Salesianos.
Particulariso, desta maneira, a
applicação, á minha vontade, das importancias, em dinheiro, recebidas,
para distribuir na inteção de Nossa Senhora das Dores, nunca me apoderei
dellas; ao contrario, ordenei sempre que fossem recolhidas aos
respectivos cófres da Igreja, hoje Matriz, os quaes estiveram sempre sob
a guarda dos Vigarios da Parochia.
Devo ainda declarar por ser para mim uma
grande honra e um dosmuitos effeitos da Graça Divina sobre mim, que, em
virtude de um voto por mim, feito, aos doze annos de idade, pela
leitura nesse tempo que fiz da vida immaculada de São Francisco de
Salles, conservei a minha virgindade e a minha castidade até hoje.
Affirmo que nunca fiz mal a ninguem, nem
a ninguem votei odio, nem rancôr e que sempre perdoei,por amor de Deus e
da Santíssima Virgem, a todos que me fizeram mal consciente ou
inconscientemente. Preciso ainda elucidar um assumpto ao qual meu por
circunstancias especiaes se acha ligado, porem no qual minha acção,
aliás pacifica, conciliadora e sempre ao lado do bem, tem sido
injustamente deturpada pelos que se deixaram dominar pelas paixões do
momento ou não souberam interpretal-a.
Nunca desejei ser político; mas em mil
novecentos e onze (1911) quando foi elevado o Joazeiro, então povoado, a
categoria de villa, para attender aos insistentes pedido do então
Presidente do Estado o meu saudoso amigo Commendador Antonio Pinto
Nogueira Accioly e, ao mesmo tempo, evitar que outro cidadão, na
direcção politica deste povo, por não saber ou não poder manter o
equilibrio de ordem até esse tempo por mim mantido, compromettesse a bôa
marcha desta terra, vi-me forçado a collaborar na politica.
Apezar das bruscas mutações da politica
cearense sempre procurei conservar-me em attitude discreta, sem
apaixonamentos, evitando sempre as incompatibilidades que podessem
determinar choques de effeitos desastrosos. Para isso consegui muitas
vezes tive de me expôr ao conceito de homens sem idéas bem definidas.
Após a queda do governo Accioly, por
motivo de ordem moral, retrahi-me da pólitica, mantendo, entretanto,
relações de cordialidade com o governo Franco Rabello sendo até eleito
terceiro Vice Presidente do Estado.
E o meu amor á ordem foi tão manifesto
que a despeito da má vontade do partido dominante para commigo, não
hesitei em attender o pedido da população desta terra e autorisar que
meu nome fosse apresentado para voltar ao cargo de prefeito deste
Municipio, naquelle mesmo governo que me era sobremaneira hostil.
Quando em Novembro de mil novecentos e
treze (1913) o meu amigo Doutor Flóro Bartholomeu da Costa, actual
Deputado Federal por este Estado, o director politico desta terra, de
volta ao Rio de Janeiro me informou que os chefes do partido decahido
haviam resolvido reunir a Assembléa Estadual aqui, por ser impossivel a
reunião em Fortaleza, em virtude da pressão exercida pelo partido
governante, e dar-lhe a direcção do movimento reacionario, com a máior
lealdade ponderei em carta reservada ao Coronel Franco Rabello sobre a
vantagem da sua renuncia.
E assim procedi porque, sem de nada de
mais grave propriamente saber (a não ser da reunião da Assembléa)
percebi, pelos precedentes de violencia, do então governo, a
possibilidade de uma lucta.
Não sendo porem attendido pelo então
Presidente Coronel Franco Rabello, e não podendo este evitar que á
sombra do seu nome fôssem commettidos actos de desatinos, entre os quaes
barbaros assassinatos e espancamentos, considerei finda a aminha ardua
tarefa afastando-me do campo de acção politica, deixando ao mesmo tempo
que o Doutor Floro agisse segundo as ordens recebidas, já que não me era
possivel poupar esta população laboriosa da triste condição de victima
indefesa.
E no período mais agudo da lucta, cujo
curso de gravidade já para mim uma surpresa, podem garantir os que a
testemunharam aqui, que a minha attitude era lastimar as desastrosas
consequencias dos erros politicos e jamais deixei de ser no sentido de
evitar violencias.
De maneira que posso affirmar, sem
nenhum peso de consciencia, que não fiz revolução, nella não tomei
parte, nem para ella concorri, nem tive nem tenho a menor parcella de
responsabilidade directa ou indirectamente nos factos ocorridos.
Eleito no biennio do governo Benjamin
Barroso primeiro Vice Presidente do Estado, apezar deste rompido
politicamente com o Doutor Floro Bartholomeu, sempre elle mantive a
maior cordialidade. Não tenho culpa é que por um despeito mal entendido e
de ordem politica, houvesse e ainda exista quem me queira tornar por
ella responsável.
Estou certo de que quando se fizer, sem paixão, a verdadeira luz sobre estes factos meu nome realçará limpo como sempre fei.
Faço estas declarações, neste documento,
para que os que me sobreviverem fiquem scientes (por que perante Deus
tenho a minha consciencia tranquila) que neste mundo, durante toda a
minha vida, quer como homem, quer como Sacerdote nunca, graças a Deus,
commeti um acto de deshonestidade, seja sob que ponto de vista se possa
ou queira encarar, nem nunca commemeti, nem alimentei embuste de especie
alguma.
Aproveito o ensejo para pedir a todos os
moradores desta nossa terra, o Joazeiro, muito especialmento aos
romeiros, que depois da minha morte não se retirem daqui nem o
abandonem; que continuem domiciliados aqui, no Joazeiro, venerando e
amando sempre a Santissima Virgem Mãe de Deus, único remedio de todas as
nossas afflicções, auxiliando a manutenção do seu culto e de todas as
instituições religiosas que aqui se fundarem e com especial menção a dos
Benemeritos Padres Salesianos que serão os meus continuadores nas obras
de Caridade que aqui iniciei.
Insistindo, peço, como sempre
aconselhei, que sejam bons e honestos, trabalhadores e crentes, amigos
uns dos outros e obedientes e respeitadores ás leis e ás autoridades
civis e da Santa Igreja Catholica Apostolica Romana, no seio da qual tão
somente póde haver felicidade e salvação.
Torno extensivo este meu pedido tambem a
todos os meus amigos, pessôas de outros Estados e Dioceses, romeiros
tambem da Santa Virgem Mãe das Dores, isto é, que continuem a visitar o
Joazeiro, em romarias a Santissima Virgem como sempre o fizeram,
auxiliando a manutenção de seu culto e das instituições religiosas que
aqui fôrem creados e com especial menção, repito, a dos Benemeritos
Padres Salesianos que serão aqui no Joazeiro os meus continuadores na
Obra de Caridade que emprhendi; e que sejam sempre bons e honestos,
trabalhadores e crentes, amigos uns dos outros e obedientes e
respeitadores as leis e as autoridades civis e da Santa Igreja Catholica
Apostolica Romana, no seio da qual tão somente poderemos encontrar
felicidades e salvação.
Estes conselhos, que sempre os dei em
minha vida, não me canço de repetil-os aqui, para que depois da minha
morte bem gravadas fiquem na lembrança deste povo, cuja felicidade e
salvação sempre fôram objecto da minha maior preocupação.
Não tenho ascendentes vivos nem tão
pouco descendentes, e assim julgo poder dispôr dos meus bens, que se
acham livres e desembaraçados, de accordo com as leis do meu paiz e dee
modo por que desejo e como se segue e o faço na plenitude de minhas
faculdades e da mais livre e espontanea vontade:
Primeira - Deixo para Ordem dos Padres
Salesianos todas as terras que possúo nos sitios Logradouro, Salgadinho,
Mochilla, Carás, Pau-Secco que pertenceu ao velho Antonio Felix, neste
Municipio; o sitio Conceição na Serra Araripe, Municipio do Crato, onde
reside o empregado Casimiro; os terrenos que possúo na serra Araripe e
mais o sitio Brejinho ao sopé da mesma serra Araripe do Municipio do
mesmo nome; os predios e a Capella em construção na serra do Horto, com
todas as suas bemfeitorias; o predio onde funcciona o açougue publico
desta cidade, sitio á Avenida Doutor Floro, antiga Rua-Nova; os predios
contiguos a casa de residencia da religiosa Joana Tertulina de Jesus,
conhecida por Beata Mocinha, onde tambem resido actualmente, sitios á
rua São José; o sitio Faustino, sito no Municipio do Crato; o sitio Paul
tambem no Municipio do Crato, porem depois do fallecimento da antiga
proprietaria Dona Ermelinda Correia de Macedo, que ainda nelle reside,
salvo se antes da sua morte quizer de accordo com os Padres Salesianos
ficar morando em outro lugar; o sitio Baixa Dantas, no Municipui do
Crato; as fazendas Lettras, Caldeirão e Monte Alto, no Municipio do
Cobrobó, no Estado de Pernambuco, com todas as bemfeitorias e gados
nellas existentes; o quarteirão de predios, sitos á rua de São Pedro, os
quais comprei ao Doutor Floro Bartholomeu da Costa, nesta cidade,
inclusive o predio em construcção na mesma rua, contiguo a casa de
morada e de negocio do meu amigo Damião Pereira da Silva; a fazenda
Juiz, sita no Municipio de Aurora que comprei aos Frades do Convento de
São Bento de Quixadá; o predio onde funcciona o Orphanato Jesus Maria e
José, sito á rua São José; o terreno contiguo a este mesmo predio; o
predio em construção junto a casa da Beata Mocinha onde resido á mesma
rua São José; o sitio Fernandes no Municipio do Crato; o sitio Peripery,
no pé de serra de São Pedro, no Municipio do mesmo nome, porem depois
da morte da sua então proprietaria Dona Maria Souto, salvo se esta de
accordo com os Padres Salesianos quizer morar em outro lugar; os sitios
Santa Rosa e Tabóca, no Municipio do Crato; o sitio Rangel, sito no
Municipio de Santa-Anna do Cariry, que comprei a Dona Joanna de Araujo, e
todas as propriedades com todas as suas bemfeitorias igualmente a estas
por mim citadas que possúo ou venha a possuir e que não constam desde
testamento, bem como todos gados que possúo por toda parte e que não
pertençam a outras pessôas ou herdeiros estabelecidos nas clausulas
deste testamento que ora faço, repito, deixo para os Benemeritos Padres
Salesianos. Supplico aos mesmos Padres Salesianos que terminem a
construcção da Capella do Horto.
Devo dizer para evitar conceitos
inveridicos e suspeitos em torno do meu nome que comecei a construil-a
para cumprir um voto que eu e os meus fallecidos collegas e amigos
Padres Manoel Felix de Moura, Francisco Rodrigues Monteiro e Antonio
Fernandes Tavora, então vigario do Crato, fizemos. Esse voto fizemos
quando apavorados com resultados da secca de mil oitocentos e oitenta e
nove (1889) receiamos, aliás, com razão justificada que o ano de mil
oitocentos e noventa (1890) fosse tambem secco, com o povo desta terra
ao Santissimo Coração de Jesus.
E como essa obra não pude terminar,
muito a contra gosto, é verdade, tão somente para não desobedecer ás
ordens prohibitorias do meu Diocesano, o então Bispo do Ceará, Dão
Joaquim Vieira, peço aos Benemeritos Padres Salesianos que concluam esse
templo de accordo com a planta que trouxe de Roma e a miniatura em
fôlha de flandre que deixo depositada em logar seguro.
Deixo mais para os Padres Salesianos, a imagem em vulto grande do Senhor Morto que me veio de Lisbôa.
Segunda - Deixo para a Santissima Virgem
das Dores desta Matriz de Joazeiro os seguintes bens: o sitio Porteiras
onde mora meu encarregado José Ignacio Cordeiro, neste Municipio; o
sobrado onde Manoel Salins tem a loja de santos, á rua Padre Cicero; o
predio onde funcciona a cadeia publica desta cidade, sito á Avenida
Doutor Floro, bem como os demais que se seguem contiguamente á mesma rua
e na rua Padre Cicero; o predio onde mora Dona Rosa Esmeralda, á rua
Padre Cicero, bem como os predios contiguos que foi o Oratorio do Senhor
Morto e em que reside a Beata Solidade e mais ainda o terreno murado a
este contiguo; o predio onde morou a Beata Isabel da Luz; o predio onde
funccionaram as redacções do "O Rebate" e da "Gazeta do Joazeiro", todos
á rua Padre Cicero, e os commodos situados ao Consistorio da Matriz
onde funcciona o Collegio do Doutor Diniz, e mais ainda o sitio Palmeira
do Municipio do Ceará-Merim, Estado do Rio Grande do Norte, com vinte
braças de largura, sem plantio mas com agua permanente cujo meu
encarregado é Pedro Vasconcellos; o sitio Petitinga do Municipio de
Touros, do Rio Grande do Norte, com vinte braças de largura, com agua
permanente e cerca de duzentos e trinta coqueiros; o sitio Sacco, do
mesmo de Touros, com cento e vinte braças de largura, agua
permanentemente e com cerca de dois mil pés de côcos entre velhos e
novos, também no Rio Grandedo Norte, dos quaes é meu encarregado
Alexrandre Mauricio de Macêdo.
Declaro mais que esses bens que deixo
para Nossa Senhora das Dores, Padroeira desta Matriz, não poderão ser
vendidos nem alienados sob que pretexto fôr. E no caso de quem quer que
seja encarregado da direcção do Patrimonio de Nossa Senhora das Dores
entender de vendel-os ou alienal-os passarão todos esses bens a
pertencer a Congregação dos Salesianos.
Terceira - Deixo para Maria de Jesus
(vulgo Babá), para Thereza Maria de Jesus (vulgo Therezinha do Padre),
para Beata Jeronyma Bezerra (vulgo Geluca) e Para Maria Eudoxia de
Assumpção o predio onde residio e falleceu minha saudosa irmã Angélica
Vicencia Romana, sito á rua Padre Cícero, para nelle residirem ou
morarem em quanto viverem, sendo que por morte da ultima sobrevivente
passará o dito predio a pertencer a Congregação dos Salesianos.
Entretanto poderão estas mesmas minhas
herdeiras durante a vida passar o referido predio aos Padre Salesianos
caso entendam e queiram ou entrem em accordo em trocar com os mesmos
Padres este mesmo predio por outro onde possam morar, comtanto que por
morte da ultima sobrevivente fique o mesmo predio trocado para os Padres
Salesianos.
Quarta - Deixo para Nossa Senhora do
Perpetuo Socorro d'aqui do Joazeiro, cuja Capella está construída no
Cemiterio desta cidade, os seguintes bens: - o sitio Porteiras que
pertenceu ao Velho Raymmundo Pinto, sito neste Municipio, á estrada do
Crato, e uma importancia em dinheiro conforme vae declarado mais
adiante.
Devo declarar que esta Capella de Nossa
Senhora do Perpetuo Socorro, que por prohibição do meu superior ainda
não foi benta para ser entregue ao culto dos fiéis, fiz construir no
Cemiterio publico desta cidade, para cumprir um voto feito pela virtuosa
e fallecida Herminia Marques de Gouveia, quando eu tive a morte de uma
molestia muito grave.
Nesta Capella fiz sepultar o seu corpo,
como ultima recompensa do seu grande esforço, e bem assim os corpos das
bôas servas de Deus Maria Joaquina, Maria de Araujo, minha bôa mãe
Joaquina Vicencia Romana e minha querida irmã Angelica Vicencia Romana. E
desejo e peço que não sejam d'ali retiradas seus restos mortaes e
supplico mais que nesta mesma Capella seja sepultado parasempre meu
corpo.
Quinta - Deixo para Capellinha de São
Miguel nesta cidade, construida no antigo Cemiterio dos variolosos pelo
bom servo de Deus Manoel Cégo, sob os meus auspicios, o terreno cercado
de arame que possuo no Arisco, conhecido por terreno do Seminário.
Sexta - Deixo para o meu amigo e
compadre Conde Adolpho Van den Brule e seus legitimos herdeiros o sitio
Veados, deste Municipio.
Setima - Deixo para a Capellinha de
Nossa Senhora do Rosario, no antigo Cemitério desta cidade, sito á
Avenida Doutor Floro, antiga Rua Nova, o sitio São José que pertenceu a
Gonçallo e sua mulher Dona Anna Rodrigues.
Oitava - Deixo para as duas filhas do
meu primo Francisco Belmiro Maia a casa onde residem nesta cidade, á rua
Padre Cícero e o sitio Carité, neste Municipio, os quaes bens por morte
da ultima passarão a pertencer a Congregação dos Salesianos, salvo se
durante a vida quizerem entrar em accordo com os Padres Salesianos para
com elles trocarem por outros bens com a mesma condição de por morte de
ambas, passarem os bens trocados aos Padres Salesianos.
Nona - Deixo para o meu amigo José
Ignacio Cordeiro, pelos bons serviços que me tem prestado, o sitio
Arraial, no Municipio de Missão Velha.
Decima - Deixo a casa de Caridade do
Crato o sobrado onde residio José Joaquim Telles Marrocos, sito á rua
Grande, na cidade do Crato, e a pequena casa encravada nos fundos do
mesmo sobrado, á rua da Laranjeira, na mesma cidade.
Decima Primeira - Deixo a minha
propriedade a fazenda Coxá encravada nos Municípios de Aurora e Milagres
e comprehendendo na mesma área os sitios Coxá propriamente dito,
Contendas, Escondido, Taveira e Bandeira com todas as bemfeitorias e com
todos os meus direitos nas minas cobre que ditas terras possam conter
bem como o sitio Lameiro sito mo municipio de Missão Velha para que
sejam vendidos e com importancia adquirida pela venda dessas mesmas
propriedades sejam pagas as dividas que eu possa deixar quando morrer,
as despezas do meu enterramento e os sufragios de minh'alma.
E o que sobrar dessa mesma importancia
seja entregue a Maria das Malvas, a Maria de Jesus (vulgo Babá), a
Thereza Maria de Jesus (vulgo Therezinha do Padre), a Beata Jeronyma
(vulgo Geluca), Maria Eudoxia da Assumpção e a cada uma das duas filhas
de meu primo Francisco Belmiro Maia quinhentos mil reis (500$000) para
cada uma e o que sobrar seja entregue a Congregação Salesiana que aqui
se fundar para os seus respectivos Padres celebrarem missas por
minh'alma e na intensão de Nossa Senhora das Dores e das almas do
Purgatorio.
Decima Segunda - Deixo ainda para Maria
das Malvas, Maria de Jesus (Babá), Therezinha do Padre, Beata Geluca e
Maria Eudoxia de Assumpção, o sitio Barro Branco, neste Municipio, para
desfructarem enquanto viverem, o qual por morte da ultima sobrevivente
passará a pertencer aos Salesianos.
Decima Terceira - Desejo ser sepultado
conforme já disse no começo deste testamento na Capella de Nossa Senhora
do Perpetuo Socorro no Cemiterio desta cidade e que os meus funeraes
sejam feitos com simplicidade, bem como que sejam rezadas pelo eterno
repouso de minha alma dôze missas em cada anno durante cinco annos
igualmente o mesmo numero de missas durante o mesmo tempo pelas almas do
Purgatorio.
Decima Quarta - Deixo mais todos os bens
que escaparam de ser citados neste testamento e os que possa adquirir
desta occasião até o meu fallecimento, repito, bens moveis, immoveis e
semoventes á Congregação dos Padres Salesianos.
Decima Quinta - Nomeio meus
testamenteiros os meus amigos Doutor Floro Bartholomeu da Costa,
actualmente Deputado Federal por este Estado, o CondeAdolpho Van Den
Brule e o Coronel Antonio LuiAlves Pequeno, servindo um no impedimento
do outro, na ordem em que se acham collocados.
Os meus referidos testamenteiros terão a
posse e a administração da herança na ordem em que se succederem e bem
assim perceberão, respeitados a mesma ordem, dez por cento (10%) em
dinheiro sobre toda herança liquida como compensação dos trabalhos
testamentarios.
E por tal modo e fórma conclúo este meu
testamento que em meu perfeito juizo e de minha livre e espontanea
vontade, sem constrangimento nem tão pouco induzido por quem quer que
fosse ditei ao meu amigo Luiz Teophilo Machado, segundo Tabellião desta
Comarca, e assigno com o meu proprio punho, de accordo com o Codigo
Civil Brasileiro em vigor.
E peço a justiça de meu paiz que o
cumpram e mandem cumpril-o tão inteiro e fielmente como nelle se contém,
declarando mais ficar por este testamento revogado outro qualquer
testamento que por ventura existir.
E por tal modo conclúo e termino este
meu testamento. Declaro em tempo que por uma resolução por mim tomada
neste momento antes de assignar este testamento ficam sem effeito os
legados que faço dos sitios Veados e Santo Antonio deste Municipio,
cujas doações a quem desejo fazer as realizarei por escriptura publica
bem como que não ficarei inhibido de vender os bens que deixo reservados
na claúsula decima primeira antes de morrer para satisfação de
quaesquer compromissos. Joaseiro 4 de outubro de 1923. Pe Cicero Romao
Bapta. (Selado com 1 (uma) estampilha de 20$000; 3 (três) de 1000 reis e
1 (uma) de 300 reis)".
Saibam quantos este instrumento de auto
de approvação de testamento virem que, no anno do nascimento de Nosso
Senhor Jesus Christo de mil novecentos e vinte e tres (1923), aos quatro
dias do dez de Outubro, nesta cidade do Joazeiro, Estado do Ceará, em
casa de residencia do Reverendissimo Padre Cicero Romão Baptista, onde
eu Tabellião vim, e sendo elle ahi presente, que reconheço pelo proprio,
que se acha de pé, em seu perfeito juizo e entendimento, segundo o meu
parecer e dos testemunhos que presentes estavam e positivamente foram
convocados, perante as quaes por elle testador das suas mãos ás minhas
me foi dado este papel fechado e cosido, dizendo-me que era seu
testamento, que eu mesmo á seu rogo e ditado por elle lh'o fizera,
queria que eu lh'o approvasse; o qual papel eu acceitei, e achei com
effeito ser o testamento do sobredito testador Reverendissimo Padre
Cicero Romão Baptista, escripto em vinte e uma laudas de onze folhas de
papel, e não achando em todo elle borrão, risca ou entrelinha, nem
cousa que duvida faça, lhe perguntei se aquelle effectivamente era seu
testamento e queria que eu o approvasse, na presença das testemunhas
abaixo assignadas, a que respondeu que este era o seu testamento e
ultima vontade; que tinha por bom, firme e valioso; que por elle
revogava outro qualquer; que rogava ás Justiças da Republica lhe dessem
cumprimento de justiça; e que era seu desejo que ficasse fechado, cosido
e lacrado e que não fosse aberto senão depois de seu fallecimento; e
por não ter cousa que duvida fizesse, rubriquei as vinte e uma laudas de
papel em que se acha escripto o testamento com o meu appellido de L.
Machado, e lh'o approvei e houve por approvado na fórma da lei, com
todas as solennidades de direito, e ficará fechado, cosido e lacrado com
sete pingos de lacre, sendo quatro por fóra e tres no centro. E para
constar fiz este auto de approvação, que assigna elle testador, do que
dou fé, sendo testamunhas presentes João Leolegario da Silva, natural do
Estado de Pernambuco, negociante; Irineu Olympio de Oliveira, natural
da Bahia, agrimensor; Abilio Gomes de Sá, natural do Estado de
Pernambuco, negociante; Francisco José de Andrade, natural de
Pernambuco, negociante; e José Furtado Landim, natural deste Estado,
escrivão da Collectoria Estadual neste Municipio e Comarca, todos
residentes nesta cidade, que reconhecem ser o dito testador o proprio,
de que dou fé, e assignarão depois de lhes ser lido por mim Tabellião
este auto de approvação. E eu, Luiz Theophilo Machado, segundo
Tabellião, o escrevi e assigno em publico e raso.
Em testemunho LM da verdade.
O 2º Tabellião Publico Luiz Theophilo Machado.
Pe Cicero Romão Bapta
João Leodegario da Sa
(Selado com 1 (uma) estampilha de 300 reis).
Irineu Olympio D'Oliveira
Abilio Gomes de Sá
Francisco José de Andrade
José Furtado Landim"
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